Vivendo fora da caixa
- Vinicius Cabral
- 21 de nov. de 2019
- 3 min de leitura

Foto: Edileila Portes
Depois de aposentado, com 35 anos de serviços prestados a um grande banco, onde por boa parte desse tempo, executei a função de Caixa Executivo, pude perceber que minha vida poderia ser descrita da seguinte forma: vivi todo o tempo, ora dentro, ora "atrás" de UM(A) CAIXA.
No trabalho, os horários eram sempre cronometrados. A porta se abria a tal hora e se fechava daí a tantas horas. No serviço a executar era sempre a mesma rotina. Todos os dias a mesma coisa. Chegar, sentar no caixa, atender com presteza e rapidez, fechar o caixa e voltar pra casa...
Em casa, não era muito diferente. Dormir e acordar mais ou menos à mesma hora, visitar os mesmos lugares, as mesmas conversas com os mesmos amigos, com a família, o mesmo horário para a prática religiosa com os mesmos temas, as mesmas reflexões, enfim... a vida particular era semelhante em qualidade, àquela vivida dentro da caixa - no Caixa no banco.
A aposentadoria porém, apresentou outras possibilidades. A começar pela flexibilidade dos horários para fazer as mesmas coisas que eu fazia antes, se assim eu quisesse. Até sobrava mais tempo para fazer o mesmo do mesmo... Mas, com certeza, não era isso que eu sonhava.
Que nova fase seria aquela? Seria uma nova saída de uma velha velha ? ou quem sabe, uma vida nova dentro de uma caixa nova ? Deveria haver sempre uma caixa? Ou talvez não valesse a pena recomeçar um novo ciclo de vida - de aposentado - dentro de uma mesma rotina que mantivesse a mesma zona de conforto.
Foi então que abriu-se a tampa da caixa...
Minha esposa acabara de editar o seu primeiro livro e eu iria acompanhá-la nas suas viagens de divulgação.
E foi assim que começou efetivamente, a minha saída do Caixa e da caixa. Novas cidades, novas paisagens, novos climas, novas pessoas... mas nada disso teria feito diferença naquele status, se não viesse o elemento principal de toda transformação: as nova ideias, a nova forma do pensar.
Os assuntos agora, eram outros; as possibilidades de observação de lugares e comportamentos eram ampliados a cada novo contato. Isso exigia de mim novas leituras, novos olhares, novas posturas...
A cada dia, a cada viagem, novos aprendizados sobre diversidade, divergências de opinião, preconceitos, democracia, economia, geopolítica, espiritualidade, redes sociais, ética, enfim... Passei a atuar e exercitar os conhecimentos adquiridos na minha área de formação acadêmica, o Jornalismo e Gestão de Territórios.
Muitas outras caixas foram se abrindo e hoje, já consigo entrar e sair de muitas delas. Transitar com mais facilidade em ambientes antes totalmente desconhecidos. Aprendi a negociar divergências conceituais e ideológicas e continuo aprendendo a cada nova situação que se apresenta.
Descobri que hoje, não há mais nada estático na minha vida, nada é imutável! Tudo se transformou ao meu olhar, assim, como também, muitas outras permaneceram, inertes, empoeiradas, a partir da percepção do que agora realmente é importante. Da mesma forma, ideias se ampliaram, visões de um mesmo objeto ou situação se abriram em possibilidades infinitas.
O mesmo ocorreu em relação a pessoas e amizades, que se transformaram, a partir dessa nova maneira de sentir a vida e experienciar emoções, valores, identidades, ambientes, formas de agir, maneiras de pensar, posicionamentos éticos e até mesmo, sentimentos envolvidos.
Não quero com isso convencer ninguém de que eu esteja certo ou errado, melhor ou pior em relação à minha antiga condição. A questão que se apresenta atualmente é a de liberdade espiritual, ideológica, filosófica, mental e social, que essa saída do Caixa - e da caixa - me proporcionaram. Sentir essa verdadeira saída da caixa: a ampliação de horizontes, a liberdade de pensar e, a partir delas, a liberdade de agir.
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